"Larry
Crowne" usa crise econômica para refletir relações humanas
A crise
financeira mundial, que explodiu no final de 2008 e que parece voltar com força
agora em 2011, já está dando suas caras no cinema americano tanto por meio de
documentários como nas ficções. Quem deu o primeiro passo, como já era
esperado, foi Michael
Moore, com Capitalismo
– Uma História de Amor, ainda em 2009. No ano seguinte, Charles
Ferguson realizou Trabalho
Interno, obra que faturou este ano o Oscar de Melhor Documentário. Em
2010, Oliver Stone também tocou no assunto ao realizar Wall Street – O Dinheiro Nunca
Dorme, sequência do longa-metragem de 1987.
Em
2011, três grandes produções abordam o tema: os ainda inéditos Margin
Call, de J.C. Chandor (com Kevin Spacey, Jeremy Irons e grande elenco), The Company Men (com Ben Affleck, Chris Cooper e Tommy Lee
Jones) e o novo filme de Tom Hanks, Larry Crowne – O Amor Está de Volta,
uma comédia romântica que também traz a recessão norte-americana como pano de
fundo.
Aqui, Hanks interpreta o sujeito que dá
título ao filme – um trabalhador exemplar de uma grande empresa que, sem mais
nem menos, é demitido. A justificativa é que Crowne não havia feito qualquer
curso universitário ao longo de sua carreira na firma, mas fica claro que o
motivo real eram os cruéis “cortes de gastos”.
Completamente perdido após o trauma e endividado por
causa da hipoteca, o sujeito que dedicou-se por anos a uma empresa que o chutou
na primeira oportunidade decide ir à luta e matricula-se num curso de oratória
numa universidade. Lá, perceberá como está perdido entre a geração dos smartphones. E a maior qualidade deste filme é justamente
brincar com a dicotomia antigo x moderno
e os créditos devem ser dados a Tom
Hanks, que assumiu o roteiro, em parceria com Nia Vardalos
(autora de Casamento Grego), e a direção – 15 anos depois de sua estreia
em The
Wonders - O Sonho não Acabou (1996).
E Hanks mostra que aprendeu muito a conduzir
uma narrativa com os grandes diretores com quem trabalhou ao longo da carreira
(entre eles, os irmãos Coen, Jonathan Demme, Robert Zemeckis
e Steven Spielberg). Afinal, o
astro consegue fugir do clichê justamente no gênero mais previsível do cinema:
a comédia romântica. Basta olhar o cartaz do filme, que já entrega de cara que
o protagonista ficará com sua professora, interpretada por Julia Roberts. Aqui, o importante não é o fim, mas o meio.
É curioso ver o próprio cinquentão Hanks
aceitando a velhice chegando, como na cena em que precisa ajeitar os óculos
para melhorar a leitura – enquanto sexagenários como Sylvester Stallone (Mercenários, Rambo IV) e Harrison Ford (Cowboys
& Aliens, Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, Firewall)
tentam perpetuar a imagem de heróis de filmes de ação. Até mesmo a grande
estrela Julia Roberts desce do pedestal de musa (como visto recentemente em Comer,
Rezar, Amar) ao dar vida à professora Mercedes Tainot, uma mulher
comum, mal-humorada, sem qualquer sex
appeal ou maquiagem para cobrir suas rugas – seu marido (o ator Bryan Cranston) diz numa cena que a
esposa é uma tábua de passar. É mesmo.
Ao questionar a própria idade, o roteirista e
diretor Tom Hanks se pergunta em qual mundo está vivendo e, como já conhecemos
pelo trabalho anterior e pelas produções que participou anteriormente, sua
visão é otimista e esperançosa. Hanks mostra que passado e presente podem
dialogar sem conflito, seja misturando
Feng Shui com GPS ou colocando os motoqueiros como a turma mais cool da
universidade – mas eles não pilotam Harley-Davidsons,
e sim lambretas.
O mesmo acontece com as brincadeiras gráficas
que o diretor faz com as trocas de mensagens de texto dos celulares, mostrando
na tela do cinema os caracteres, como se o próprio espectador estivesse
recebendo o SMS. É uma ideia muito divertida, principalmente porque a maior
parte acontece durante as aulas do professor vivido por George Takei (outro símbolo do passado, o Hikaru Sulu da série Star Trek).
No fundo, a proposta do filme é resgatar as
relações humanas, priorizar o coletivo em detrimento do individual – não à toa,
os motoqueiros descolados são compostos por homens, mulheres, brancos, negros,
latinos... Diferente de, por exemplo, À Procura da Felicidade, onde Will Smith precisa enfrentar – e vencer
– todo o sistema sozinho, Larry Crowne
privilegia o grupo. Talvez isso explique a farpa mais afiada que é direcionada
ao fenômeno das redes sociais virtuais, representada pelo marido da professora
vivida por Julia Roberts: o sujeito, que finge trabalhar em casa escrevendo
para um blog (mas passa a maior parte do dia vendo pornografia) é um babaca repugnante.
Com
tanto escapismo em cartaz, é ótimo ver uma produção tão simples ter tanto a
dizer – e refletir sua época. A boa química entre os atores, o humor leve e o
clima esperançoso dão a Larry Crowne
um forte clima de “Sessão da Tarde” – mas aqueles especiais, como Curtindo
a Vida Adoidado ou o próprio The
Wonders, trabalho anterior de Tom Hanks.
Amei o filme, acabei de assistir ao acaso no CINEMAX. Li outras críticas e achei super injustas . Sua crítica é muito mais coerente . É um filme que prende atenção, tem um humor leve e despretencioso.
ResponderExcluir