segunda-feira, 28 de março de 2011

VIPs - CRÍTICA


Era uma questão de tempo para a história de Marcelo Nascimento da Rocha virar filme: o farsante que aprendeu a pilotar avião ao se envolver com traficantes de drogas, deu uma entrevista na televisão fingindo ser filho do dono da empresa de aviação Gol e, na cadeia, enganou os internos dizendo ser um dos líderes do PCC é o tipo de personagem perfeito para o cinema, por conta da amplitude de possibilidades de abordagem: comédia, drama, ação, suspense.

Pois é justamente com esse olhar que o diretor estreante Toniko Melo conduziu VIPs, inspirado no livro Histórias Reais de um Mentiroso, de Mariana Caltabiano (que também irá lançar em breve um documentário homônimo). A grande sacada do roteiro de Bráulio Mantovani e Thiago Dottori foi pegar a história e as peripécias de Marcelo como fio condutor para uma ficção – e não uma cinebiografia –, o que permitiu ao filme tentar buscar respostas psicológicas a um personagem tão complexo.
 
“Como eu sou?”, pergunta o protagonista à sua mãe (Gisele Fróes). Em palavras, não há respostas, mas a sua imagem fragmentada no espelho representa essa busca por uma identidade própria, mesmo que, para isso, seja preciso forjar personalidades ou se passar por outras pessoas. É inevitável a comparação entre VIPs e Prenda-me se For Capaz (de Steven Spielberg), mas as produções seguem caminhos diferentes. Enquanto Leonardo DiCaprio interpreta um falsário (Frank Abagnale Jr.) que visa ganhar dinheiro com seus golpes, o Marcelo de Wagner Moura é alguém que realmente acredita nas fantasias que cria (ainda que essa escolha dos produtores redima os erros e crimes do Marcelo da vida real).

Aliás, Wagner Moura é a alma do filme. Apesar de se tratar de um personagem de múltiplas facetas (inclusive um garoto de 17 anos), em nenhum momento nos lembramos do icônico Capitão Nascimento. O papel lhe valeu o prêmio de melhor ator no Festival do Rio 2010 e aumenta as expectativas para sua estreia em Hollywood, como o vilão de Elysium, nova produção de Neill Blomkamp (Distrito 9).

Apesar de divertir, e muito, a discussão de VIPs sobre a procura por uma identidade toca num assunto sério em sua subcamada: a busca pela existência e por um reconhecimento social. A mãe de Marcelo passa o dia assistindo à programas televisivos sobre celebridades, principalmente o de Amaury Jr. Por diversas vezes, ela cobra do filho para que ele não seja um “Zé Ninguém”, o que, pela lógica, significa ser alguém do mundo da TV – um meio de comunicação de reafirmação, onde é possível mostrar a todos que você existe.
   
        Marcelo, de certa forma, alcança esse objetivo, quando é entrevistado justamente por Amaury Jr, interpretado pelo próprio apresentador – símbolo maior deste raso e fantasioso mundo das celebridades. Irônico.


*Texto publicado no site www.arteview.com.br

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