sexta-feira, 22 de abril de 2011

BRÓDER - CRÍTICA


A câmera persegue desesperadamente três garotos que correm por entre as vielas e corredores estreitos do Capão Redondo. No entanto, aqui, eles não estão fugindo da polícia ou de traficantes. Trata-se de uma brincadeira, uma disputa para ver quem chega primeiro ao local combinado. É com essa visão carinhosa da periferia como extensão da casa e um lugar acolhedor que trata “Bróder”, ótima estreia de Jeferson De na direção de um longa-metragem.

Após passar por diversos festivais, a produção chega ao circuito comercial e dá novo fôlego ao cinema nacional ao mostrar a periferia com os olhos de alguém de dentro, fugindo um pouco do óbvio e dos temas batidos que foram se acumulando nos últimos anos.

Na história, três amigos de infância se reencontram depois de um período de distanciamento: Pibe (Sílvio Guindane) decidiu sair do Capão Redondo e se tornou corretor de imóveis, mas passa por problemas financeiros; Jaiminho (Jonathan Haagensen) virou jogador de futebol na Espanha e promessa de futuro craque da seleção brasileira; Macu (Caio Blat) continuou no bairro e está prestes a entrar no mundo do crime ao aceitar que sua casa seja o cativeiro para uma criança que será sequestrada.

Os três decidem aproveitar a festa de aniversário de Macu para reforçar a amizade e passar o dia juntos passeando pelo bairro no qual cresceram, mas a coisa complica quando os traficantes da área decidem aproveitar a passagem de Jaiminho para sequestrá-lo. É nessa hora que Macu precisará decidir qual atitude tomar: proteger o amigo ao custo de comprar uma dívida com os criminosos ou usar a situação como prova de sua coragem para entrar no grupo dos traficantes.
 
“Bróder” é cheio de acertos, a começar pela escolha do Capão Redondo como locação. O bairro da Zona Sul da capital paulista não é apenas um ambiente para a história, mas um personagem do filme, além de servir como microuniverso do Brasil das contradições e das facetas multiculturais. As situações mostram que Jeferson De tem muito mais dor de cabeça do que Spike Lee na hora de fazer críticas sociais e raciais. E a família de Macu mais uma vez mostra o homem da casa como um elemento fraco, simbolizando a ausência do Estado – uma metáfora frequente no cinema nacional.

Mas a interessante história (elaborada por Jeferson De em parceria com Newton Cannito), o olhar diferenciado e os belos planos e enquadramentos não seriam suficientes para sustentar o filme se não houvesse uma perfeita química entre os atores, e o elenco não decepciona. Além da sempre competente Cássia Kiss, que interpreta a sofrida Dona Sônia, mãe de Macu, e Aílton Graça, no papel do padrasto inseguro e alcoólatra, Bróder funciona por conta de sua trinca de protagonistas.

 A sintonia entre os três é evidente e os atores nos fazem acreditar que são realmente amigos de infância. Guindane traz em seu semblante as incertezas de alguém que ainda está descobrindo na pele as dificuldades da vida adulta – e sem dinheiro. Haagensen é o jovem que acabou de ficar rico, mas que não esquece suas origens. Ele troca a comida de restaurantes chiques pela feijoada da madrinha, e sua felicidade em estar no bairro natal é expressa pelo carisma e sorriso de Haagensen.

Inevitavelmente, é Caio Blat quem mais chama a atenção e mais uma vez ele entrega uma interpretação memorável (como já havia feito em “Batismo de Sangue”, por exemplo). O ator desaparece sob a pele de Macu, seja no linguajar carregado de gírias, seja na malemolência do andar ou no semblante fechado e agressivo. Macu é mais um desses milhões de jovens que são tragados pela violência, não por status, nem porque ele é naturalmente mau, mas simplesmente porque suas opções tornam-se a cada dia mais raras e porque o crime faz parte de seu cotidiano.

Como o próprio diretor brinca, Bróder é sobre a família do Zé Pequeno (personagem do filme “Cidade de Deus”), é sobre como esses garotos se tornam “Zé Pequenos” diariamente. Aliás, há outro paralelo entre o filme de Jeferson De e de Fernando Meirelles: é em Bróder que conhecemos o verdadeiro “Trio Ternura”. 

   CURISOSIDADE: Caio Blat incorporou com tanta eficácia o personagem Macu que ele chegou a ser expulso de um restaurante, durante a pausa das filmagens. O segurança do estabelecimento achou que ele queria roubar o local.


*Texto publicado no site www.Plugou.com.br

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