quarta-feira, 20 de abril de 2011

RICKY - CRÍTICA


Adaptação da novela inglesa “Moth”, de Rose Tremain, “Ricky” finalmente chega aos cinemas brasileiros (a produção é de 2009). Escrito e dirigido por François Ozon (“O Amor em Cinco Tempos”, “Swimming Pool”), “Ricky” conta a história de uma desestruturada família suburbana na França que vive uma situação fantástica quando o bebê que dá nome ao filme desenvolve asas e passa a voar pela casa.

O diretor francês é experiente em retratar personagens femininas (como se pode ver em “Angel” ou “Oito Mulheres”) e esse cuidado fica evidente ao apresentar Katie (Alexandra Lamy), mãe solteira que precisa segurar as pontas para criar Lisa (Mélusine Mayance), sua filha de sete anos. Carente e depressiva, a mulher trabalha numa fábrica e não parece ter muitos planos para seu futuro, enquanto a garotinha amadurece precocemente ao sentir que não pertence a uma família “normal”.

Ozon cria um clima de extremo naturalismo no primeiro ato, seja na falta de maquiagem e sensualidade de Katie, ou nas questões sociais implícitas, como o ambiente fabril, o bairro periférico onde mora a protagonista e até mesmo a imigração, quando a mulher conhece o espanhol Paco (Sergi López), um colega de trabalho. Não há romantismo nem glamour no casal, que transa no banheiro da fábrica cinco minutos após se conhecer.
 
Esse clima de naturalismo vai aos poucos cedendo lugar à fantasia quando duas asas crescem nas costas do bebê Ricky, filho do casal. O clima surreal de um neném voador serve como válvula de escape para o drama dentro da casa: para a pequena Lisa, Paco não parece poder substituir o pai, que a abandonou anos atrás. Sua mãe também não tem lhe dado a devida atenção depois que passou a namorar o espanhol e ter outro filho. Já Katie, além dos problemas financeiros, volta a ser mãe solteira após acusar Paco de maltratar o bebê.

Essa alternância de tensão familiar e momentos de comicidade com o desenvolvimento dos cotos e primeiros voos de Ricky pontuam a proposta de Ozon em brincar com as sensações do telespectador: na fase pré-penugem, as asas da criança lembravam a de um frango – que, minutos antes, Lisa saboreou no almoço –, o que causa uma certa repulsa. Já os passeios aéreos do bebê são dúbios: podem ser considerados tão engraçados quanto tensos. Basta se perguntar: a cena no parque é triste ou traz alívio?
  
O realismo fantástico de “Ricky” não procura dar explicações, como mostra o misterioso prólogo, mas ficam evidentes algumas pistas dadas por Ozon, principalmente quando a pequena Lisa está em cena. Só faltou um pouco de cuidado com os efeitos especiais, mas nada que estrague este interessante filme.

*Texto publicado no site www.CinemaNaRede.com

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