quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

ÔNIBUS 174 - CRÍTICA


Ônibus 174, de José Padilha (Tropa de Elite), conta a história de Sandro Nascimento, o rapaz que seqüestrou um ônibus após uma frustrada tentativa de assalto, no ano 2000. Como todos já sabiam, o filme conclui com a morte do sequestrador e de uma das reféns. A proposta do documentário é mostrar como Sandro foi parar naquele ônibus, com uma arma na cintura e pronto pra enfrentar o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar (Bope).

Padilha inicia o filme com uma longa tomada aérea da imensidão das favelas nos morros cariocas. Enquanto o helicóptero passeia pelo complexo de barracos que se formaram ao longo dos anos, percebemos que a tomada é uma metáfora visual sobre o tamanho da pobreza e desigualdade social que assola nosso país. Isso fica evidente quando a câmera vai se afastando do subúrbio e dos morros e alcança os enormes prédios da classe média, passando pelos cartões postais que insistem em carimbar o Rio de Janeiro como a “Cidade Maravilhosa”.
 
Entrecortado por depoimentos de algumas reféns, de policiais que participaram da operação, e de psicólogos e especialistas na área criminal, o documentário procura entender quem era Sandro Nascimento, como foi sua infância, sua adolescência e, finalmente, o que o levou a tomar uma atitude desesperada de sequestrar um ônibus e virar notícia nacional. E uma das mais chocantes revelações é o fato de Sandro ter sido um dos garotos sobreviventes da Chacina da Candelária.

Numa investigação mais profunda, é revelado, também, que Sandro viu sua mãe ser degolada na sua frente. Sem família, foi parar nas ruas. Com diversas passagens pelas vergonhosas instituições socioeducativas, vamos descobrindo o tratamento desumano do qual milhares de jovens passam em todas as regiões do Brasil. Não há dúvidas de que a história de Sandro era uma tragédia anunciada.

Apesar de causar risos quando uma das reféns conta que, durante o sequestro, ela atendeu o celular e avisou ao patrão que chegaria um pouquinho atrasada, pois estava em um assalto, vemos como a situação da violência virou rotina e faz parte do nosso dia-a-dia, como se fosse a coisa mais normal do mundo. Triste, porém, é ver como a polícia carioca estava despreparada para atuar numa situação que exigia, acima de tudo, calma e comunicação.

E a falta de comunicação é o primeiro dos erros cometidos pelo Bope. Os soldados conversavam através de códigos e sinais, sem utilizar instrumentos e equipamentos. Planejamento também foi outro ponto falho: em uma cena, um homem fura facilmente o bloqueio e passa de bicicleta tranquilamente entre os policiais. “Os cursos, o treinamento, tudo desabou quando Sandro resolveu sair do ônibus”, declara um soldado do Bope, sem se identificar.
  
A conclusão da história, e do filme, causa apreensão, angústia, desapontamento, revolta... é difícil classificar qual sentimento bate mais forte quando descobrimos que uma das balas que matou a refém saiu da arma do policial que tentou atirar em Sandro. Mas isso não é tudo. O sequestrador foi morto dentro do carro do Bope, por estrangulamento. Vemos, então que o ciclo se fechou: Sandro escapou da Candelária, mas morreu nas mãos da Polícia, anos mais tarde. Ao vivo, na tevê.

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