Na terceira parte da análise sobre o atual cinema nacional, conheça a visão de alguns diretores sobre a própria sociedade
Fazer cinema ou construir uma fossa? Um país tem o direito de gastar milhões de reais fazendo cinema enquanto metade da população não tem saneamento básico? Jorge Furtado levanta questões sociológicas e culturais e analisa o próprio cinema nacional com Saneamento Básico, o Filme (2007). O roteiro: uma cidadezinha gaúcha do interior, carente de recursos básicos de saneamento, recebe dinheiro público, porém para ser gasto em produção cinematográfica. Ao final da projeção, o próprio diretor lembra que num país onde falta tudo, tudo é essencial.
Outras produções também analisam a sociedade brasileira por dentro, caso de Amarelo Manga (2002) e Baixio das Bestas (2006), ambos de Cláudio Assis, e O Céu de Sueli (2006), de Karim Aïnouz – todos se passam na periferia do nordeste brasileiro, fugindo do assunto “sertão”. Tem, também, Carandiru (2003), do argentino naturalizado brasileiro Hector Babenco, sobre a reconstituição do massacre de 111 detentos realizado pela tropa de choque de São Paulo, no então maior presídio da América Latina.
Apesar de não ser 100% brasileiro, a adaptação de Fernando Meirelles para Ensaio sobre a cegueira (do Nobel de Literatura José Saramago) também pode entrar no grupo de filmes que analisam a sociedade. Através da metáfora sobre a perda da visão por uma cegueira inexplicável, Saramago / Meirelles mostram como as pessoas vão perdendo sua humanidade, situação que alcança clímax nas tão polêmicas cenas dos estupros coletivos. Com elenco estelar (Julianne Moore, Danny Glover, Gael García Bernal, Mark Ruffalo e Alice Braga), o filme tem cenas rodadas em São Paulo, Montevidéu e Montreal.
Selton Mello viveu os últimos dias do brasileiro Jean Charles, morto pela polícia britânica em 2005 ao ser confundido com um terrorista. A direção ficou a cargo do brasileiro radicado em Londres Henrique Goldman. O cinema nacional, como se vê, está discutindo assuntos importantes, como gosta de fazer Cláudio Assis. “O artista tem de mostrar e as pessoas tirarem suas conclusões e reagirem. Para mim, cinema não é diversão, é assunto sério”.
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